Lendo Contos: A Nova Califórnia de Lima Barreto

…mas era a Morte, a Morte implacável onipotente, de quem ela também se sentia escrava, e que não deixaria um dia de levar a sua linda caveirinha para a paz eterna do cemitério.

Começando então com os trabalhos ou melhor, com as leituras do projeto n-estórias, hoje trago comentários sobre minha releitura de A Nova Califórnia, um conto de Lima Barreto, que cumpre com o desafio número três do projeto “ler/Re-ler um conto do teu autor favorito”.

Eu gosto muito da obra de Lima Barreto, dos autores nacionais é um que sempre me chamou a atenção. Esse conto sem dúvida é um dos meus favoritos da vida, onde encontro uma escrita afiada como bisturi, caractéristica que mais admiro do autor, é realmente incrível!

Um Doutor?

Tudo começa com a chegada de um tal de Raimundo Flamel em Tubiacanga, uma cidadezinha de interior. As pessoas ficam todas alvoroçadas de curiosidade sobre o estranho, “comentando” sobre qual seria a origem do tal homem, até que após algumas semanas de boatos, chegam a um consenso que seria então, um químico. Certo dia, o tal doutor químico compartilha um segredo com três dos homens mais importantes da cidade e simplesmente some. E então, acontece algo inesperado e bizarro. Os ossos do cemitério da cidade começam a desaparecer…

O conto é suspense do início ao fim e o final propriamente, não decepciona.

Horror

Desde que li o conto A causa Secreta de Machado de Assis, eu passei a refletir sobre o que causa “horror” ao ser humano. E aqui vale lembrar do conceito de horror da escritora gótica Ann Radcliffe: “… um sentimento de obscura incerteza em relação ao mal que tanto teme.” Tememos em primeira instância, o que não podemos controlar, e para mim é sempre fascinante quando essa noção aparece na literatura não em relação à um ser imaginário ou a um desastre natural, mas em relação à própria natureza humana.

Em A Nova Califórnia essa ideia não fica tão clara como no conto citado do Machado, mas aparece, intrincado com o tema da morte como não poderia ser diferente, os homens têm horror à morte – e aqui me refiro ao literal: cemitério, ossos, decomposição…

É uma literatura que choca em um primeiro momento, mas muito convidativa a reflexão sobre o “eu”. Cai o disfarce, a máscara, o alto engano. A natureza humana é corrupta, egoísta, gananciosa, invejosa. É preciso enxergar essa verdade. E cá para nós leitores, a literatura pode nos ajudar muito com isso, ou seja, colocar um espelho na nossa frente para vermos quem realmente somos (sem mimimi).

Além desse olhar politicamente incorreto para o homem, o conto faz algumas críticas à sociedade e as crenças religiosas. Para quem não associou ainda, Lima Barreto, é o autor de Triste Fim de Policarpo Quaresma, um dos maiores clássicos da literatura brasileira, vale a pena conhecer.

*Créditos imagem cabeçalho


+INFO: A NOVA CALIFÓRNIA | Autor: Lima Barreto (1881-1922) | Publicado originalmente em 1915 | Edição lida: Os cem melhores contos brasileiros do século; Rio de Janeiro: Objetiva, 2001

Classificação: 5 | Leia grátis: aqui | Compre: aqui

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